domingo, 17 de março de 2024








 

Sacer Profanare - Kali Malone

 «Então dei-me conta de que me faltava algo. Era como se a vida que eu tivesse já muito desperdiçada e não aguentava mais esticões. Disso me dei conta.»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 20

 ''Não dizemos o que pensamos. Há bastante tempo que se nos acabou a vontade de falar.''

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 12

parodista

 ''Saudade é um pouco como forme. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda  que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda.''

sábado, 16 de março de 2024

''Treme o coração da ave.''

 Tu Fu

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 179






 

FORTUITAMENTE

 Compor uns versos. Com a idade, preguiça tenho.
Os vários anos somente tenho por companha.
Vida anterior: por engano, me votaram à poesia
Se noutra fosse teriam feito pintor de mim.
Nesta medida é difícil abandonar uns hábitos
Mesmo acontece ser conhecido por tal coisa.
Nome de nascença, nome do fundo, certo ambos
Mas o coração pelo contrário ninguém conhece.

Wang Wei

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 147

[DOLÊNCIA DOS APARTADOS FEMININOS]

 Gineceu dentro esta mulher nova não sabe de tristezas
Dia de Primavera, e preparada, o balcão sobre azulado
Repentino, sobre o pequeno dique um tom: choupo, salgueiro
Lamenta ter dito ao marido para ir procurar emprego longe.

Wang Changling
690-756

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 133

Yoshiko Sai Kuraitabi Dark Journey 佐井好子 暗い旅

''Homens recentes cumprem expedições longínquas''

Li Qi

690-751

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 131

''Sozinho, amargas lamentações deito.''

Chen Zi'Ang

656-698

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 121

''(...), por este luar, alguém quem ama lembra.''

 

Zhang Ruoxu
c.660 - c.720

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 117

 

dar com a verruma no prego
deparar com obstáculo ou dificuldade

OUVINDO NA PRISÃO UMA CIGARRA

 A terra roda para Oeste a cigarra começa o zagarreio
Memórias profundas suscita neste exílio, o Sul.
Custa-me ouvir esta figura de asa escura
Verrumando, um prisioneiro de cabelo branco.
É difícil subir ela o molhado, pesando neste orvalho
E no vento demais forte a sua voz desaparece.
Nenhuma criatura admite sua altura e natureza
Quem irá dilucidar o que me vai no coração?

Luo Binwang
640-648?

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 113

La Confession


                      Žydėjimas, Blossom (1974–1984) Photographs by Romualdas Rakauskas

sexta-feira, 15 de março de 2024

 Vive o homem a vida numa tigela de poeira
É como bichinhos dentro de um jarro
Todo o dia andando à volta
Nunca sai lá de dentro.
Não nos calha a ventura
Só temos em sorte desgraças
O tempo parece um rio
Que corre. Um dia, acordamos velhos.

Han Shan

séculos V-VI

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 111

''Eis-me aqui melancólica e deitada no quarto vazio''

 
A Dama  Hou
séculos V-VI

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 109

lábil

''Vem lá a angústia, a via, da morte, que é longa''

TUOBA
[Último Imperador dos]
m.531

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 105


 

Nick Cave & The Bad Seeds - Carry Me


Carry me, father, carry meOh my father, carry me, ohFather, carry me (Tayki de Tayki de Tayc)
Oh Father, carry meFather, carry meOh my father, carry me, ohFather, carry me
Sans toi j'ai tellement froid, tellement froid, nonMais je dois rester un hommeJe dois tout, tout, tout cacherSans toi j'ai tellement froid, tellement froid, nonEt crois moi tout ce que tu donnesMoi, j'ai tout, tout, tout garder
J'appelle une foisJe rappelle une autre foisDepuis, moi j'attendsMais tu ne réponds plusJ'appelle une foisJe rappelle une autre foisDepuis, moi j'attendsMais tu ne me connais plus
Plus que des motsIl ne me reste plus que des motsMais ce serait lâche de te dire qu'on doit continuerEn niant qu'on va vers la mortPlus aucun motToi, tu ne disais plus aucun motEt aujourd'hui la douleur m'inondeJe t'ai vu creuser nos tombesParle moi, parle moi même si c'est pour m'insulterDis-moi que je suis l'homme que tu détesteMais ne m'ignore plus jamaisEt s'il te plaît parle moiParle moi, dis moi juste que tu parsLes regrets sont arrivés trop tardTu ne reviendras jamais, Jamais
Sans toi j'ai tellement froid, tellement froid, nonMais je dois rester un hommeJe dois tout, tout, tout cacherSans toi j'ai tellement froid, tellement froid, nonEt crois moi tout ce que tu donnesMoi, j'ai tout, tout, tout garder
J'appelle une foisJe rappelle une autre foisDepuis, moi j'attendsMais tu ne réponds plusJ'appelle une foisJe rappelle une autre foisDepuis, moi j'attendsMais tu ne me connais plus
Carry me, father, carry meOh my father, carry me, ohFather, carry me
Oh Father, carry meFather, carry meOh my father, carry me, ohFather, carry me
Father, oh, Niami Djèla, ohOh Niami FatherNyambe, NyambeFather, Niami Djèla, ohOh Niami FatherNyambe, Nyambe

GRASNAM À NOITE CORVOS

 Anónimo
[Yuefu]
século V

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 103

''A fome era tanta, esquecíamos.''

Shen Yue

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 99

''tenho evitado tais errâncias''

 Xie Lingyun 

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 95

TESTAMENT0

 Tal Gong Sheng, pouca vida me resta
Como Li Ye, eis-me no fim, encurralado.
Xi, o antigo, foi vítima da justiça,
Também Huo sacrificado foi.
Mete dó, o cipestre que a geada mordeu
Desfeito é o «míscaro» que a borrasca tombou.
Quanto dura afinal a existência?
Não é que me aflija o ela ser breve.
Dói-me somente o meu ideal de gentil-homem
Que não possa ser gravado no sopé da falésia.
Despedir-me da alma sem o instante supremo
Eis o que me há tanto tempo tormento.
O meu voto ei-lo. Que na vida futura
Amigos e inimigos, tenham um só coração.

Xie Lingyun 

385-433

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 93

 « Je ne suis pas ministre pour ajouter une ligne sur Wikipédia »

Aurore Bergé 

quinta-feira, 14 de março de 2024


American Photographer Dorothea Lange

 

quarta-feira, 13 de março de 2024

RAIO DE FILHOS

 Cabelos brancos me levam as têmporas
As carnes já, não muito seguras
E é que tenho cinco filhos.

(...)


Tao Yuanming

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 91

''Asa que foge e me rasga o coração.''

Cao Zhi, 192-232

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 83

 ''Duro é o trabalho do povo. Ãh!
Dar e dar. E sem fim. Ãh!''


Liang Hong

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 77

 ''De tanto pensar em vós envelheci mais cedo''


Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 71

Woman in the Dunes, 1964


 

'' O teu coração doendo bate.''

 

Imperador dos Han, Liu Qie

r. ~141 ~87

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 63

[ LAMENTO DOS CABELOS BRANCOS ]

 Brancos estão meus cabelos como neve da montanha
Brancos como a lua por entre as nuvens
Sei que destes o vosso coração -
Por isso vim: é preciso separarmo-nos.


(...)

Anónimo

[ Zhuo Wenjun c. 200 ]

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 59

''Aí vêm as águas - turbulentas.''


Chuci
Canções de Chu
Qu Yuan
~340 ~278

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 53

[ CANÇÃO DE BATER NO CHÃO ]

 Nasce o sol trabalhamos
Põe-se o sol descansamos.
Cavamos um poço para beber,
Lavramos um campo, p'ra comer:
O Imperador e o seu poder
- Queremos lá saber!


Autoria: anónimo c. 1000?

Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 49

Pombos Torcazes


 

''Corno de licorne''

 Shijing


Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989, p. 43

Rapaz Raposa

Este rapaz feiticeiro
Desdenha falar comigo
Sim é por causa dele, Senhor
Que deixo a comida no prato.

Este rapaz raposa
Comigo comer não quer
Sim é por causa dele
Que já descanso não tenho


Shijing


Uma Antologia de Poesia Chinesa. Gil de Carvalho. Assírio & Alvim, Lisboa, 1989

segunda-feira, 11 de março de 2024

José Mário Branco - Poder

 Um herói

À mesura

Da sua estatura

Vai sempre à procura

Ond' inda ninguém foi


Um herói

Não descura

Um ou outro dói-dói

Uma dura aventura

Não mata mas mói


Caso venha a ser preciso

Arriscar qualquer coisinha

Na operação

Um herói no seu juízo

Leva sempre uma pilinha

Em cada mão

Com a cobertura da instituição

Mais aquilo do Deus-Pátria-Canhão

Um herói nunca se corta

Meio olho-vivo, meio mão-morta

A porta

Não importa


Um herói

Façanhudo

É de tudo capaz

Faz ao peixe miúdo

O que mais ninguém faz


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Canção dos Despedidos

José Mário Branco

Se Do Império

José Mário Branco

Grândola, Vila Morena

José Afonso


Um herói

Catrapás

Salta dos quadradinhos

Puxa os cordelinhos

E eles vêm atrás


Com algum equipamento

Assegura a quadratura

Da operação

E o simbólico instrumento

É uma armadura dura

Em cada mão

Um herói é o garante, o bastão

Dessa coisa do Deus-Pátria-Canhão

Nunca tеme, nunca se corta

Come pеixinhos da horta

Mulher morta

Não aborta


Poder

Quem o tem, tem ascendente

Poder

Quem o tem, faz-se valente

Bem usado

Mal usado

O poder é prepotente

Assim

Diz o povo amiúde

Assim

Herói era toda a gente

Mais val' rico e com saúde

Do que pobre e doente

You Don't Own Me

domingo, 10 de março de 2024



                     Francesca Woodman, From a calendar of 6 days, this is the 6th day, Rome, 1977
 

Não existe corpo em boa forma. Existe apenas espaço,
extensão, possibilidades infindas,
o facto de podermos tocar aquele ramo de bétula ali,
apanhar da valeta o calhau branco.
O corpo doente está em toda a parte: o quarto, o pátio, 
o caminho até ao poço, a casa e o céu azul-claro
estão repletos dele. O coração doente
é tão grande que tudo toca nele,
ofendendo-o e magoando-o. Um ramo de abeto que balouça
rente à vedação precipita-se e fere-te o rosto.
O vento que arremessa a vassoura de bruxa
atravessa num sopro o teu peito.
Os gritos das andorinhas atingem-te como marteladas.
A noite cai como um velho cobertor molhado  sobre os teus
                                                                                         olhos e boca.


Jaan Kaplinski [Estónia]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 200
«A destrutividade é o resultado de uma vida não vivida.
Aquilo que não pode crescer para fora cresce para dentro»


Jaan Kaplinski [Estónia]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 196

Conhecimento

 Soubesse eu ao certo como esta folha se desprendeu do seu ramo
E calar-me-ia secretamente para a eternidade: pois saberia o
                                                                                             suficiente.


 Hugo Von Hofmannsthal [Áustria]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 193

Nick Cave & The Bad Seeds - Wild God


 

''Eu não sou um homem. Não quero destruir-te.''

 Harold Norse [EUA]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 188

 «Eu não sou um homem. Choro quando me sinto infeliz.

Eu não sou um homem. Não me sinto superior às mulheres.»


Harold Norse [EUA]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 188

morangais

''evitas o folguedo''

 Giacomo Leopardi [Itália]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 170

''respirar ar viciado deprime-me''

 


Forough Farrokhzad [Irão]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 150
 «Fala comigo
O que haveria de querer de ti quem oferece a ternura de uma
                                                                                 carne viva»


Forough Farrokhzad [Irão]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 148

sábado, 9 de março de 2024


 

''no quadro 
e os estorninhos partiam em furiosa debandada
da velha árvore

Eu venho do meio das raízes de plantas carnívoras
e tenho o cérebro ainda a transbordar
com o guincho aterrorizado de uma borboleta
crucificado com alfinetas
num caderno''


Forough Farrokhzad [Irão]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 146
''das estações secas das experiências impotentes na amizade e no
                                                                                                     amor''

Forough Farrokhzad [Irão]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 145

''O meu coração está carregado, carregado.''

 Forough Farrokhzad [Irão]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 144

''Esvazio-me de todos os gritos dolorosos''

Forough Farrokhzad [Irão]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 143


 

 


1.
disposição ou tendência para evitar ou recusar o esforçoindolência, preguiça
2.
falta de zelo ou de atençãodesleixo, incúria, negligência

''É tão fácil perdermos se ficarmos quietos''

Fernando Valverde [Espanha]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 136
 ''está na hora de ser filho de alguém
e de ter um filho
e um esqueleto para ir ao mar,
para morrer
com cada osso sem pedir ajuda''


Fabio Morábito [México]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 132




 

 ''fechar todos os olhos que fui abrindo
para que ninguém me agredisse.''


Fabio Morábito [México]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 132
''reunir-me com a minha mãe noutro tempo,
com um eu mesmo que enterrei
e que ela guarda 
sem dizer nada'' 


Fabio Morábito [México]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 132
 ''um século de interioridade
a cumprir-se.
Ressequiu-se dos seus filhos
e vive longe''

Fabio Morábito [México]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 131
 ''A usura mata a criança no ventre
Impede o galanteio do rapaz
Trouxe o marasmo para a cama, pôs-se
entre a jovem noiva e o seu noivo''


Ezra Pound [EUA]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 127

''faz-se o nosso pão cada vez mais de farrapos bolorentos''

 

Ezra Pound [EUA]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 126

sexta-feira, 8 de março de 2024




 

Carole King - Will You Love Me Tomorrow?

palinódia

 «(...)  que eu, deste meu sofrer assim, sofro cada vez
                                                                menos: que me 
suporto cada vez melhor)»


Edoardo Sanguineti  [Itália]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 116

''fábula-cadáver''

 Edoardo Sanguineti  [Itália]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 108

''dulcíssimos tormentos da vida''

 Edoardo Sanguineti  [Itália]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 107

 «Talvez seja o que não dizemos

aquilo que nos salva.»


Dorianne Laux  [EUA]

Vasco Gato. Lacre. Traduções e Versões de Poesia. 5ª Edição. Língua Morta., p. 100

Tori Amos - Gold Dust


 

 Carnac

fragmentos


1

Mar à beira do nada,
Que se mistura ao nada,

Para melhor saber o céu,
As praias, os rochedos,

Para melhor os receber.


2

Algum dia brincaremos,
Por uma hora que seja,
Nada mais que alguns minutos,
Oceano solene,

Sem que tenhas tu esse ar
De outra coisa te ocupar?


3

Sabes de mais que todos te preferem,
Que mesmo aqueles que te deixaram

Nos trigos te reencontram,
Na erva te procuram,
Na pedra te escutam,
Sem que jamais consigam agarrar-te.


4

Tem qualquer coisa a ver
Com a noção de Deus,

Água que já não és água,
Poder desprovido de mãos e de instrumentos,

Peso sem emprego
Para quem o tempo não existe.


5

Sejamos justos: sem ti
De que me servia o espaço
E as rochas de que serviam?


6

Não temos margens, na verdade,
Nem tu nem eu.


7

Ouve bem o que faz
A pólvora explodindo.

Ouve bem o que faz
O frágil violino.


8

Sei bem que há outros mares,
Mar do pescador,
Mar dos navegadores,
Mar dos marinheiros e guerreiros,
Mar dos que querem morrer no mar.

Não sou um dicionário,
Falo só de nós dois

E quando digo o mar
É sempre o de Carnac.


9

As mesmas terras sempre
A teres de acariciar.

Jamais um corpo novo
Que possas ensaiar.


10

As profundezas, que procuramos,
Serão as tuas?

As nossas têm poder de chama.


11

Demasiado largo
Para ser cavalgado.

Demasiado largo
Para ser estreitado.

E flácido.


12

Se acaso acreditas no valor dos sons
Deves sentir-te arrepiar
Só de ouvir este nome de mar.


13

Tu vais e vens
Mas dentro de limites

Fixados por uma lei
Que não chega a ser tua.

Nós temos em comum
A experiência do muro.



guillevic
carnac (1961)
vozes da poesia europeia III
traduções de david mourão ferreira
colóquio letras 165
fundação calouste gulbenkian
2003

Fonte: ver aqui
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