quarta-feira, 12 de maio de 2010

O mar é uma das referências mais constantes do universo lírico de Luís Miguel Nava. O mar e todos os elementos que naturalmente lhe estão associados: ondas, rebentação, falésias, etc.

À volta do campo semântico gerado pelo mar, gravitam dois temas essenciais: a infância e o amor. Logo no poema inaugural de Películas se pode ler “… isto explode e entra/nesta página o mar da minha infância, meigo/no modo de lembrá-lo, lê-lo, de acender um texto na memória”.Numa poesia tão ostensivamente corporal, o mar também entra no corpo e mistura-se com ele. O mar ora é objecto motor que arrasta consigo, deflagrando, os lugares e as presenças mais impressivas da infância, ora é objecto movido. Em qualquer dos casos, é o mar uma força inexpugnável: “…às vezes extravio-me, ao enfiar pela memória/as ondas saem-me ao caminho”, ou “..o mar de que deflagram/as ondas por acção da memória”. A estreita relação existente entre o mar e as recordações parece ser bem clara, pois “..disponho alguns retratos junto ao mar, o mar/rebenta-lhes em cima e atravessa-os, fica dentro/deles”. É ainda a energia do mar que traz consigo a figura da mãe, e também, embora com muito menos força, a figura do pai, duas das presenças mais relacionadas com a infância.

Como representação da pele, o mar conduz-nos ao domínio dos afectos.


António Manuel Ferreira. Luís Miguel Nava: até à raiz da alma. Universidade de Aveiro. Diagonais das letras portuguesas contemporâneas, p. 129

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