domingo, 14 de novembro de 2010

«Outro dia olhei pra os teus olhos, ó Vida! E pareceu-me que me afundava no insondável.
Mas tu pescaste-me cá pra fora como um anzol de ouro; riste escarninha, quando eu te chamei insondável.
«É o que dizem todos os peixes», disseste tu; « o que eles não podem sondar, é insondável».
Mas eu sou apenas mutável e bravia, e em tudo mulher, e nada virtuosa.
Embora vós homens me chameis «profunda» ou «fiel», ou «eterna», ou «misteriosa».
Mas vós, homens, presenteais sempre com as vossas próprias virtudes, ó virtuosos!»
Assim se ria ela, a incrível; mas eu nunca creio nela nem no seu riso quando diz mal de si mesma.
E quando um dia eu estava a falar a sós com a minha brava Sabedoria, disse-me ela, colérica: «Tu queres, tu desejas, tu amas, e é só por isso que tu louvas a Vida!»



F. Nietzche. Poemas. Antologia, Versão Portuguesa, Prefácio e Notas de Paulo Quintela. 2ª Edição Revista. Centelha, Coimbra, 1981,p. 233

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