quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

A estepe


«Durante as tardes e as noites de Julho já não se ouvem as codornizes, nem as galinholas, nem o rouxinol, nas ravinas da floresta; as flores já não embalsamam o ar. No entanto, a estepe continua ainda muito bela e cheia de vida. Basta que o Sol se ponha e a terra mergulhe na sombra para que a tristeza do dia seja esquecida e tudo seja perdoado; a estepe suspira suavemente pelo seu grande peito. A obscuridade da noite esconde o seu estigma, a erva anima-se numa alegre confusão juvenil que durante o dia ela nunca consegue ter; os estalidos, os assobios, as arranhadelas, os baixos, os tenores e os sopranos da estepe, tudo se funde num zumbido contínuo que convida à saudade e à melancolia. Esta ressonância adormece como uma canção de embalar; rola-se através da estepe e sente-se que vai adormecer, mas de repente é o grito inquieto e sacudido dum pássaro que ainda não adormeceu, ou num barulho indefinível semelhante a uma voz humana, como um «aaah» de espanto, e lá se vai o sono das pálpebras.»



Anton Tchekoff. A Estepe. Livros de Bolso/ Europa-América. 2ª ed.Trad. Maria do Carmo Santos, 2003., p. 46/47

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