quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Por isso me sinto morto.

A LADRA

Roubei pão, porque tinha fome.

O JUIZ, erguendo-se e largando o livro

Sublime! Função sublime! Tudo isso vai ser julgado por mim. Oh, minha querida filha, só tu me consegues reconciliar com o mundo. Juiz! Vou ser juiz de todos os teus actos! De mim vai depender a medida, o equilíbrio. O mundo é uma maçã para eu cortar ao meio: os bons, os maus. E tu, meu Deus, tu aceitas ser a parte má! (Para o público.) Debaixo dos vossos olhos: nada nas mãos, nada nos bolsos, explicar o podre e deitá-lo fora. Mas que ocupação dolorosa! Se todos os julgamentos fossem feitos a sério, custar-me-iam a vida! Por isso me sinto morto. Habito esta região da liberdade exacta. Rei dos Infernos, todos os que eu julgo, estão como eu: mortos. Esta está como eu: morta.
Jean Genet. A Varanda. Tradução de Armando da Silva Carvalho.Colecção Presença/Nova Série, Lisboa, 1976., p. 46

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