quarta-feira, 1 de maio de 2013

Isto é o hálito escuro
de Sodoma
e a carga
de Nínive
pousada
junto à ferida aberta
da nossa porta.

Isto é a Escrita sagrada
em fuga pela terra
trepando ao céu
com todas as letras,
escondendo a emplumada
ventura num favo de mel.

Isto é o negro Laocoonte
lançando à nossa pálpebra
perfurando milénios
a retorcida árvore da dor
rebentando na nossa pupila.

Isto são dedos inteiriçados em sal
gotejando lágrimas na oração.

Isto é a Sua causa marinha
recolhida
para a cápsula marulhante dos mistérios.

Isto é o nosso refluxo
Constelação da dor
da nossa areia a desfazer-se





Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 145/6
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