segunda-feira, 10 de novembro de 2014

«A Loura era uma viúva - o Louro morrera tempos atrás. Tratava-os com poucas palavras e com maus modos; via-se que receava dar confiança às pessoas; era o género de mulher que põe o marido no olho da rua para depois chorar por ele à noite. Pippo dizia que era sonâmbula - tinha, na verdade, o rosto descarnado e olheiras, próprias das viúvas e das sonâmbulas. Passava todo o tempo nos fundos do quintal, donde nos espiava através dum buraco feito na parede da casa. À noite, tinha por hábito fazer as contas em cima duma mesa do seu quarto, e pagava-me à percentagem. Dormia num canto escuro, onde cheirava a petróleo e a bafio. Quando chegava, de manhã, esperava-me à porta; desaparecia mal eu entrava, sem dizer sequer «bom dia». Andaria pelos trinta anos de idade.»
 
 
Cesare Pavese. A guitarra quebrada. Traduzida pelo italiano por José da Fonseca Costa. Editorial Minerva, Lisboa, p. 152
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