quinta-feira, 19 de março de 2015

CIDADE SOZINHO


"Tudo aqui tem o mesmo abandono:
um quarto com janelas
para a rua e um corpo sem desejo
diante da chuva. Uma mulher que passa
- a luz presa debaixo das meias -
e que desaparece, deixa
o eco de um gemido na pupila
e a saliva quente do suor
na memória.
Hotel sem graça,
uma jarra com água à cabeceira,
uma revista dentro do armário,
o fio com um menino jesus
sobre o decote, e a mão - a minha mão -
percorre o náilon.
Agora as páginas
do diário devolvem-me a esta noite,
fria noite num quarto frio.
Para que servirá a inteligência?
Um número na porta, um cheiro acre."

-"Antologia"
- José Ángel Cilleruelo
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