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segunda-feira, 14 de julho de 2014

omnia mutantur, nihil interit: errat et illinc / huc venit, hinc illuc, et quoslibet occupat artus / spiritus eque feris humana in corpora transit / inque feras noster, nec tempore deperit ullo, / utque novis facilis signatur cera figuris / nec manet ut fuerat nec formam servat eandem, / sed tamen ipsa eadem est, animam sic semper eandem / esse, sed in varias doceo migrare figuras. / ergo, ne pietas sit victa cupidine ventris, / parcite, vaticinor, cognatas caede nefanda / exturbare animas, nec sanguine sanguis alatur!

Tudo se transforma, nada morre. O espírito vagueia e anda / daqui para ali, dali para aqui, e invade um corpo, qualquer / que ele seja, e dos animais, e em instante algum perece. / Tal como a dúctil cera se molda sempre em novas figuras, / E não permanece como era, nem conserva as mesmas formas, / E, no entanto, é sempre a mesma, assim a alma é a mesma, / (...) mas transmigra para uma variedade de formas.

Ovídio, Metamorfoses, XV, vv. 165-173 (trad. P. F. Alberto, Lisboa, Cotovia, 2010, p. 369).






segunda-feira, 13 de junho de 2011

4.

Não devo atrever-me a defender os meus depravados costumes
    e a terçar falsas armas em defesa dos meus vícios.
Confesso - se alguma utilidade tem confessar os pecados;
   mas logo depois de confessar, caio, de cabeça perdida, nos meus erros.
Odeio e não sou capaz de não desejar o que odeio.
   Pobre de ti! Aquilo que porfias por deixar, quão penoso é carregá-lo!
Faltam-me forças e poder para me governar a mim mesmo;
   sou arrastado, como proa baldeada pela força das ondas.
Não é uma beleza, em especial, que estimula o meu amor;
   cem são as razões para eu estar, sempre, a amar:
se há uma que baixa os olhos com recato,
   deixo-me inflamar, e aquele pudor é para mim cilada;
se há outra que é provocante, sou cativado por não ser simplória
   e por me dar esperança de ser bem viva na doçura do leito;
se me pareceu agreste e a imitar as severas Sabinas,
   ela quer, mas, na sua sobranceria, finge, eis o que eu penso;
se és culta, agradas-me pelos teus dotes - tão raros - para as artes;
   se és rude, agradas-me pela tua própria simplicidade.
 Há uma que afirma que, ao pé dos meus, são toscos os versos
   de Calímaco?Pois se lhe agrado, de pronto ela me agrada;
há, também, a que me condena, como poeta, e condena os meus versos;
   e eu desejaria suportar o peso das coxas daquela que me condena.
Uma caminha com elegância - o seu movimento cativa-me; outra é bronca
- mas poderia tornar-se bem mais elegante no contacto com um homem.
Esta, porque canta com doçura e com ligeireza faz evoluir a sua voz,
    quereria eu dar beijos arrebatados àquela que está a cantar;
estoutra percorre, com a agilidade do polegar, as queixosas cordas,
    tão sabedoras mãos, quem não seria capaz de as amar?
Aquela tem um rosto aprazível e faz mil movimentos com os seus longos
                                                                                                                braços
    e com a elegância e arte bamboleia o peito delicado;
para não falar de mim mesmo, que me deixo tocar por qualquer motivo,
   coloca ali Hipólito: tornar-se-ia um outro Priapo.
Tu, por seres tão alongada, emparceiras com as antigas heroínas
   e és capaz, com o teu corpo, de ocupar o leito inteiro;
esta é elegante na sua pequenez: por uma e outra sou arrebatado;
   ambas, a alta e a pequena, caem bem ao meu desejo.
Não é elegante - e vem-me à ideia que elegância poderia acrescentar-se-lhe;
   está cheia de enfeites - que ela mostre as suas próprias prendas.
A alvura da sua pele há-de seduzir-me, há-de seduzir-me a mulher bem rosada;
   e até com cores baças é prazenteiro o amor;
se tombam, de uma fronte branca como a neve, cabelos negros,
    Leda fazia-se admirar pela sua negra cabeleira;
se são ruivos, a Aurora era aprazível pelos seus cabelos cor de açafrão.
   A todas as histórias o meu amor é capaz de adaptar-se.
Uma idade jovem seduz-me, uma idade mais madura toca-me;
   aquela por ter mais beleza de corpo, esta por possuir sabedoria.
Enfim, as mulheres que podem apreciar-se em toda a cidade de Roma,
   a todas elas pode o meu amor abranger.»




Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 70/1

sábado, 11 de junho de 2011

«Oh, quantas vezes, diante de alguém que te admira os cabelos, hás-de corar
      e dizer: ''agora, é graças a mercadoria comprada que me elogiam;
não sei que sicambra está este, agora, a gabar, em vez de mim;
      mas lembro-me bem de como era assim a minha falam.''
Pobre de mim! A custo sustém as lágrimas e, com a mão, protege
      o rosto, a face altiva corada de vermelho;
segura no regaço os cabelos de outrora e contempla-os.
     Triste sorte! Não eram eles merecedores de estar naquele lugar!
Repõe, com as forças do rosto, as do coração! É dano que podes reparar;
     em breve, hás-de ser contemplada com os teus cabelos naturais.»




Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 59
«foram feitos por tua mão e tua culpa os prejuízos que padeces;
     tu mesmo servias à tua cabeça uma mistura de veneno.»



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 59
« Agora, todo o medo se desvaneceu, no meu coração está sarada a loucura,
     e essa beleza não cativa já os meus olhos.
Porque assim mudei? - perguntas. Porque reclamas uma paga;
     esse motivo não consente que possas dar-me prazer.»



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 52

sexta-feira, 10 de junho de 2011

«Quem, a não ser o soldado ou o amante, suportará o frio da noite
      e nevões misturados com densas chuvadas?»



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 50
«Que os deuses te não dêem lar algum, que te dêem uma velhice indigente
    e longas invernias e sede por todo o sempre!»


Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 49
«a beleza, se fechares as portas, acaba por envelhecer, se não for cultivada.»


Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 47

Ela corou

«Ela corou. 'Fica bem o pudor à candura do rosto, mas apenas
      se o fingires te será útil; quando autêntico, costuma ser nefasto.
Quando baixares o olhar com recato e contemplares o teu regaço,
     à medida do que te trouxer, assim deves pôr o olhar em cada homem.»



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 47

domingo, 29 de maio de 2011

''Io! Foi por um homem valente que uma mulher foi vencida!''

«Caminhe adiante a cativa, triste e de cabelos desgrenhados,
     toda ela resplandecente de brancura, se o consentissem as faces magoadas.
Teria sido bem melhor que estivesse lívida de sinais deixados pelos lábios,
    e que no colo delicado mostrasse marcas dos dentes.
Enfim, se eu estava a deixar-me levar à maneira de uma torrente impetuosa,
    e uma raiva cega me tinha feito presa sua,
não teria bastante praguejar contra uma mulher assustada
    e gritar ameaças bem cruéis
ou mandar-lhe abaixo a túnica, à bruta, do cimo do rosto
   até meio corpo? No meio, a cintura, havia de trazer-lhe ajuda.
Mas não me contive e arrepanhei-lhe os cabelos da testa
   e, com crueldade, marquei-lhe, com as unhas, as faces delicadas.
Ela para ali ficou, desvairada e sem pinga de sangue na palidez do rosto,
   qual pedaço de mármore caído das colinas de Paros;
o corpo inanimado e os membros a tremer, eis o que eu vi,
   tal como a brisa agita a folhagem do choupo,
tal como é sacudido pelo sopro leve do Zéfiro o vime frágil
    ou o cimo da onda é golpeado à passagem morna do Noto.
Largo tempo contidas, começaram as lágrimas a deslizar-lhe pelo rosto,
    como de um manto de neve escorre a água.
Então, comecei eu, primeiro, a sentir-me culpado;
    eram sangue meu as lágrimas que ela derramava.»



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 45
«(...); não receio sombras, que esvoaçam pela
                                                                noite,
    não receio mãos estendidas para minha perdição;
é a ti, por seres teimoso demais, que eu receio, só a ti quero amansar;
   és tu quem possui o raio com que podes levar-me à perdição.
Vê bem (e, para veres, dá meia folga ao portal)
   como está encharcada a porta com minhas lágrimas.»


Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 41

sábado, 28 de maio de 2011

«palavras, hás-de lê-las nos dedos, palavras escritas com vinho puro.»



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 37

sexta-feira, 27 de maio de 2011

(...)


«Mesmo então, não poucos, se bem te conheço, vais inflamar,
      mesmo então, ao passar, muitas serão as feridas que vais fazer;
não são capazes de descansar, ainda que tu mesmo o queiras, as tuas setas;
o ardor da chama é nefasto a quem lhe está próximo, com o seu bafo.
Assim era Baco, quando dominou as terras do Ganges;
    tu és penoso com os teus pássaros, ele foi-o com seus tigres.
Já que eu posso, portanto, ser parte do teu sagrado triunfo,
    poupa-te e não gastes em mim as tuas forças de vencedor;
contempla os exércitos venturosos do César, teu parente;
    por onde alcançou vitórias, os vencidos ele os protege com sua mão.



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 35
« Eu mesmo, a tua presa mais recente, hei-de padecer da ferida sofrida há
                                                                                                           pouco
e suportar no coração cativo novos grilhões.



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 34

Na antecâmara dos Amores

 «Mas o que é, afinal, o amor para este homem, versejador fácil e amante confesso e compulsivo? Uma espécie de divertimento? A busca do prazer? O culto reiterado do sexo? Um estranho caldear de emoções e afectos?
   E o que significará, para ele, a mulher? O outro parceiro de uma relação a dois? O segundo elemento de uma partilha? O simples objecto do prazer? Um alvo ou uma vítima da perversão masculina? Um mero instrumento da satisfação dos desejos do homem?
    E de que se tece a relação a dois, pois que de relação a dois se trata? Da espontaneidade de sentimentos? Da explosão do desejo e dos sentidos? Do engano? Da lealdade? Da traição? De sementes de um projecto? De jogos de sedução? De arranjos tácticos e ocasionais?
   E qual o ideal de parceiro na relação amorosa? A mulher? O homem? Com um padrão de beleza? Com um perfil de carácter?»


Introdução Carlos Ascenso André



Ovídio. Amores. Tradução, introdução e notas de Carlos Ascenso André. Livros Cotovia, Lisboa, 2006, p. 9
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