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sábado, 21 de junho de 2014

TEOLOGAL


Agora é definitivo:
uma rosa é mais que uma rosa.
Não há como deserdá-la
de seu destino arquetípico.
Poetas que vão nascer
passarão noites em claro
rendidos à forma prima:
a rosa é mística.



Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p. 124

MEDITAÇÃO À BEIRA DE UM POEMA

Conheci a cólera de Deus,

«Os escritores são insuportáveis
                          menos os sagrados,»


Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.97

quarta-feira, 18 de junho de 2014

ARTEFATO NIPÔNICO

A borboleta pousada
ou é Deus
ou é nada.



Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.96

A FORMALÍSTICA

 
O poeta cerebral tomou café sem açúcar
e foi pro gabinete concentrar-se.
Seu lápis é um bisturi
                    que ele afia na pedra,
na pedra calcinada das palavras,
imagem que elegeu porque ama a dificuldade,
     o efeito respeitoso que produz
                           seu trato com dicionário.
Faz três horas já que estuma as musas.
O dia arde. Seu prepúcio coça.
Daqui a pouco começam a fosforescer coisas no mato
A serva de Deus sai de sua cela à noite
                            e caminha na estrada,
passeia porque Deus quis passear
                                            e ela caminha.
O jovem poeta,
                                  fedendo a suicídio e glória,
rouba de todos nós e nem assina:
                                   ''Deus é impecável''.
As rãs pulam sobressaltadas
                                     e o pelejador não entende,
quer escrever as coisas
 
 
 
 
 
Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.94

sábado, 14 de junho de 2014

A CÓLERA DIVINA

Quando fui ferida,
por Deus, pelo diabo, ou por mim mesma,
- ainda não sei -
percebi que não morrera, após três dias,
ao rever pardais
e moitinhas de trevo.
Quando era jovem,
só estes passarinhos.
estas folhinhas bastavam
para eu cantar louvores,
dedicar óperas ao Rei.
Mas um cachorro batido
demora um pouco a latir,
a festejar seu dono
 - ele, um bicho que não é gente -
tanto mais eu que posso perguntar:
por que razão me bates?
Por isso, apesar dos pardais e das reviçosas folhinhas
uma tênue sombra ainda sobre meu espírito.
Quem me feriu perdoe-me.



Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.71
''neste quarto meu pai morreu,
aqui deu a corda ao relógio
e apoiou os cotovelos
no que pensava ser uma janela
e eram os beirais da morte''

Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p. 66

Comecei a chorar de prazer e vergonha.

buracos negros no peito

quinta-feira, 12 de junho de 2014

A MAÇÃ NO ESCURO

Era um cômodo grande, talvez um armazém antigo,
empilhado até o meio de seu comprimento e altura
com sacas de cereais.
Eu estava lá dentro, era escuro,
estando as portas fechadas
como uma ilha de sombra em meio do dia aberto.
De uma telha quebrada, ou de exígua janela,
vinha a notícia da luz.
Eu balançava as pernas,
em cima da pilha sentada,
vivendo um cheiro como um rato o vive
no momento em que estaca.
O grão dentro das sacas,
as sacas dentro do cómodo,
o cómodo dentro do dia
dentro de mim sobre as pilhas
dentro da boca fechando-se de fera felicidade.
Meu sexo, de modo doce,
turgindo-se em sapiência,
pleno de si, mas com fome,
em forte poder contendo-se,
iluminando sem chama a minha bacia andrógina.
Eu era muito pequena,
uma menina-crisálida.
Até hoje sei quem me pensa
com pensamento de homem:
a parte que em mim não pensa e vai da cintura aos pés
reage em vagas excêntricas,
vagas de doce quentura
de um vulcão que fosse ameno,
me põe inocente e ofertada,
madura pra olfato e dentes,
em carne de amor, a fruta.














Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p. 41
«Uma mulher espantada com sexo:
mas gostando muito.»



Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.38
(...)

«A alegria dele desertava, quase, do que fosse
uma alegria humana e não estávamos à altura de entendê-la.
Sofrer era muito mais fácil.»



Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.27

«(...)

Quem entender a linguagem entende Deus
cujo filho é o Verbo. Morre quem entender.



Adélia Prado. Com Licença Poética. Selecção e prefácio de Abel Barros Baptista. edições Cotovia, Lisboa, 2003., p.6
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